quarta-feira, 6 de março de 2013

Felizes para sempre? Ou até que a vida os separe?




Ana Carolina Seara

Relacionamentos são um tema que abre muitas possibilidades de reflexão; nos dias atuais, cada vez mais fica em evidência a dificuldade de as pessoas construírem e manterem um relacionamento. Quantos casais você conhece que  estão há mais de 20 anos casados? Quantos casais você conhece que, em menos de 10 anos de convívio, se separaram? Se a cotação à primeira pergunta foi mais alta do que para a segunda, você está entre um seleto grupo de pessoas!

Não que eu faça alguma apologia aos casamentos de longa data ou seja partidária  de que se manter casado a qualquer custo seja melhor do que estar separado, ou já ter vivido vários relacionamentos. Até porque, a questão aqui talvez não seja o que é melhor ou pior. E se fosse, pior ou melhor pra quem? Pra quê? Para a felicidade dos casais? Para os filhos dessa união? Para as famílias de origem? Para a sociedade? Para a saúde?

O fato é que o número de separações vem aumentando vertiginosamente. E a questão, talvez seja: o que isso representa? O que esse dado está nos revelando? Hoje em dia, e já há alguns anos, homens e mulheres estão de igual pra igual no mercado de trabalho  (talvez não em remuneração, mas em competência e formação técnica, certamente); vivemos uma época em que individualismo, competição, produção, eficiência, pró-atividade, dinamismo são cada vez mais valorizados; somado  a isso  temos as influências do meio virtual, da globalização, da mídia. E os relacionamentos? Em que lugar das prioridades individuais eles estão? Hoje em dia, dificilmente se demanda de um adolescente ou jovem que tenha um bom casamento ou escolha um marido ou esposa que lhe faça feliz, hoje as demandas são: faça o vestibular, escolha um curso! Tenha um bom trabalho! Compre seu carro, construa sua casa!  Ganhe dinheiro! E...consuma!

O que mais se vê nas festas são  jovens  (e os nem tão jovens em idade, mas que já aderiram às “convenções” atuais de relacionamento) sem saber o que esperar desse outro ou em como se comportar: beijos e abraços que duram o tempo de uma “balada” ou de um encontro marcado.  Os mais jovens talvez não questionem esse formato, os balzaquianos parecem perdidos entre a geração do compromisso formal e do “vale-tudo”; e os mais velhos vivem a liberdade depois da desilusão de relacionamentos desfeitos mas não sabem mais qual seu lugar na relação, “pagar ou não pagar a conta” virou a questão.

Para eles (e aqui falo dos heterossexuais), a queixa frequente é de que as mulheres estão independentes, auto-suficientes, parecem não “precisar” mais de um homem ao lado para serem felizes, e elas gritam aos quatro cantos que estão “muito bem obrigado”, mas será? E para elas, tão perdidas quanto os homens,  o estudo,  o trabalho, as viagens (em outras palavras, o reconhecimento social) passou a ter tanta prioridade que parece que  elas perderam a habilidade de se relacionar.

Mas, relacionamento não é um produto. Bem que as empresas virtuais de relacionamento tentam, tentaram ou ainda estão tentando, formar “pares”, num mundo em que as pessoas parecem estar desencontradas. Pessoas não são produtos! Amor não é um somatório de qualidades,  características físicas e de “personalidade” dividido pelos defeitos.  Amor talvez seja algo que a ciência ainda está tentando entender, conceituar, mas possivelmente nunca poderá explicar.  Ele acontece por inúmeros motivos e sem nenhum. Não podemos medi-lo, quantificá-lo, só podemos senti-lo. Talvez seja isso que  ainda preserva a sua beleza e o seu mistério.

Relacionamento envolve negociação, paciência, tolerância, parceria e amor. Certa vez, num casamento o padre perguntou aos pais dos noivos o que  era necessário para a felicidade do casal, um deles respondeu:  “coragem!”, no princípio aquela resposta me chocou, mas refletindo um pouco mais sobre isso talvez ela faça muito sentido. Coragem: ousadia, destemor, energia e firmeza diante do perigo, perseverança. Talvez seja preciso muita coragem para comprometer-se com alguém (e num casamento se faz isso todos os dias), coragem para arriscar o encontro com um estranho que se julga conhecer muito bem, pois é na relação que o risco de se ver espelhado no olhar alheio acontece, reflexo que pode revelar as mais lindas formas ou as mais terríveis sombras. É na relação, ou no relacionar-se, que conheço coisas sobre mim que eu nem supunha: é desnudar a alma confiando na capacidade do outro em suportar e cuidar daquilo que está sendo exposto.  E além disso tudo, talvez seja preciso coragem, para depois de muito suportar uma relação que produz mais desamor do que amor decidir abandonar o barco, e com ele, os sonhos, os projetos e os desejos para aquele relacionamento.

O que se espera de uma relação? Algumas vezes penso que o que se espera de uma relação é que ela permaneça sempre igual. A mesma exigência imposta nos dias atuais para a aparência física, que as marcas do tempo sejam apagadas, a gravidade controlada e que a vitalidade dos 18 anos ressurja. Num relacionamento, as pessoas desejam que a paixão dos primeiros anos continue sempre igual, que as mudanças (trabalho, filhos, lutos, conquistas, etc.) não interfiram, que o sexo e o humor não se altere. Nem todos os dias acordamos bem, a cada dia podemos encontrar uma nova marca  no rosto, descobrir uma tarefa que já não executamos com a mesma destreza de antes e, a não ser que alguém tenha  a curiosa patologia do Benjamin Button, assim será.

Mas cada marca traz consigo um aprendizado. Se pudermos aceitar que as coisas mudam, que o tempo passa e que isso faz parte da nossa condição humana, talvez seja mais fácil aceitar que as relações se modificam, mas que o amor pode suportar essas modificações. E é preciso coragem para aceitar esse convite, para embarcar numa aventura que não se sabe o fim. Mas, se não a tivermos, teremos ficado ancorados a ver navios, a ver a sombra das possibilidades que nunca aconteceram, como navios fantasmas, presos a relações que duram uma noite, a imagens que nunca envelhecem, mas que perdem um pouco do brilho e do encanto a cada dia.

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